35ª Bienal de São Paulo
6 set a 10 dez 2023
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São Paulo
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Vista de obra Timur Merah Project IX: Beyond The Realm of Senses (Oracle and Demons) de Citra Sasmita durante a 35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível © Levi Fanan / Fundação Bienal de São Paulo

Citra Sasmita

A artista balinesa Citra Sasmita recorre ao estilo Kamasan − um tipo de pintura secular − para produzir uma arte que reconhece a beleza das tradições, mas que também faz uma crítica do patriarcado e do colonialismo na cultura de seu país. O estilo de origem tradicional era o modo com o qual os povos indonésios mais antigos − nos séculos 15 ao 18 −, representavam calendários, e, sobretudo, feitos supostamente heróicos das elites masculinas tradicionais, como guerras e demais atos de bravura. Mas, na versão artística de Sasmita, essa iconografia ganha um novo sentido. 

Por meio de suas mãos e de seu olhar artístico e político, em sua obra, a pintura Kamasan, também feita sobre couro ou tecido, tem novas personagens como protagonistas. Em seu projeto artístico Timur Merah [Leste vermelho], mulheres indonésias de longos cabelos negros trançam a existência umas com as outras e com elementos da natureza. O vermelho do sangue e do fogo jorra da cabeça, do ventre; corpos inteiros estão em chamas ou formam um invólucro que as recobre por inteiro. 

Com corpos que se incendeiam e que se mutilam em sofrimento, Sasmita expressa as dores e as opressões sofridas sob o patriarcado, que afetam essas mulheres, ainda que elas estejam no centro de tudo. Cabeças cortam-se e são cortadas. Porém, curiosamente, essas mulheres produzem vida, pois de seu ventre brotam árvores, assim como brotam também da cabeça dessas figuras. Os galhos, abrindo em folhas verdes, crescem em direção ao céu. 

Essas mulheres deusas que compõem figuras femininas mitológicas em geral não aparecem sozinhas. Criando, procriando natureza ou em sofrimento, elas produzem dor e prazer umas às outras; elas estão juntas, em um só corpo, ou vivenciam suas experiências umas ao lado das outras. Várias cabeças femininas povoam a existência de uma só mulher, demonstrando que elas fazem parte de uma experiência circular, coletiva. 

Corpos incompletos e pernas resumem o desejo de fuga. Rios formados por mulheres compõem um círculo ribeirinho em suas margens nos remetendo à mitologia da sociedade tradicional, relembrada pela ótica feminista da artista. Mulheres são deusas das águas e do fogo. 

No projeto Timur Merah, com o protagonismo das mulheres mitológicas, musas, deusas, criaturas meio-humanas, meio-feras, meio-árvores, Sasmita encontra formas possíveis por meio das quais finalmente ganham vida perspectivas impossíveis. Se isso não foi possível na arte Kamasan tradicional, séculos depois a artista reconta a história através da arte. 

luciana brito

Citra Sasmita (Tabanan, Indonésia, 1990) revisita elementos, mitos, e iconografia antiga da cultura e literatura balinesa para questionar lugares-comuns e o lugar da mulher na hierarquia social. Sua obra é composta principalmente de pinturas, esculturas e instalações. Seus trabalhos já foram expostos na Jogja National Museum (Yogyakarta, Indonésia) e Museum MACAN (Jacarta, Indonésia) e serão exibidos na Thailand Biennale 2023/24 (Chiang Rai, Tailândia). Em 2017, ganhou a UOB Painting of the Year.